Tancredo Neves foi protagonista de um dos episódios mais insólitos da nossa história. Eleito presidente do Brasil, em 1985, passou mal um dia antes de sua posse, precisando ser internado e operado. Faleceu vítima das complicações de seu problema de saúde, e a presidência foi assumida pelo vice, José Sarney.
Estudou em dois colégios locais e quando terminou seu ensino básico, em 1927, procurou ingressar em alguma universidade para conquistar melhores oportunidades na vida. Na graduação, Tancredo foi obrigado a trabalhar para manter seus estudos, porque sua família não tinha a mesma condição financeira desde que seu pai havia falecido, em 1922.
Tentou ingressar nas carreiras de engenheiro, marinheiro e médico, mas fracassou ou desistiu dessas opções de carreira e acabou ingressando na área do Direito, quando se viu sem opções. A Faculdade de Direito ficava em Belo Horizonte, forçando Tancredo a mudar-se para a capital de Minas Gerais. Lá ele trabalhou em diferentes ofícios para poder sobreviver até a conclusão do seu curso, em 1932.
A partir de 1932, além de ter iniciado sua carreira de advogado, Tancredo também foi preso pela primeira vez, justamente por participar de um evento de apoio aos paulistas que participavam da Revolução Constitucionalista de 1932. No ano seguinte, Tancredo filiou-se a um partido político de pequena expressão e iniciou, oficialmente, o seu envolvimento com a política.
Em 1935, Tancredo Neves concorreu ao cargo de vereador em São João del-Rei e foi eleito como o candidato mais votado. Assumiu o posto e tornou-se presidente da Câmara de sua cidade. Essa experiência política de Tancredo durou pouco, porque, em novembro de 1937, o golpe do Estado Novo implantou uma ditadura e colocou fim na atuação do Legislativo em todo o país. Com isso, Tancredo retomou a sua carreira de advogado e seguiu nela até meados da década de 1940.
No segundo governo de Getúlio Vargas, Tancredo recebeu um convite do presidente para assumir o Ministério da Justiça em um dos momentos mais críticos da nossa história política. Tancredo Neves recebeu o papel de tentar frear a onda golpista que estava presente na política brasileira. Teve de lidar com os efeitos da crise causada pelo Atentado da Rua Tonelero, em agosto de 1954.
Além disso, Tancredo foi eleito em diferentes momentos durante a Quarta República para os cargos de deputado estadual e federal. Atuou diretamente para garantir a vitória de Juscelino Kubitschek na eleição presidencial de 1955, mas não ocupou nenhum cargo político durante esse governo. No decorrer de todo esse período, Tancredo esteve filiado ao PSD, o Partido Social Democrático.
Durante a tentativa de golpe com as iniciativas para impedir a posse de João Goulart (também chamado de Jango) como presidente, Tancredo Neves interveio com a solução que resolveu essa crise. A sua sugestão de o Brasil aderir ao parlamentarismo foi adotada e isso garantiu a posse de Jango em 7 de setembro de 1961.
Tancredo Neves foi escolhido como primeiro-ministro do Brasil e ocupou o posto por dez meses, mas renunciou pelas dificuldades do cargo. Ele candidatou-se a deputado federal e foi eleito em 1962.
Tancredo Neves aderiu ao partido da oposição aos militares, o Movimento Democrático Brasileiro (MDB). O político mineiro nunca foi um opositor ferrenho e radical da postura, portanto, sempre preferiu uma posição menos radical e mais conciliatória. Com o desgaste dos militares no poder, Tancredo tornou-se um dos políticos mais influentes na luta pela redemocratização.
Em 1978, foi eleito senador e, em 1982, elegeu-se governador do estado de Minas Gerais, ao derrotar o candidato dos militares, Eliseu Resende. Tancredo obteve mais de 2,5 milhões de votos e a vitória, em um dos maiores colégios eleitorais do Brasil, referendou Tancredo para a disputa pela presidência que seria realizada em 1985.
Ele era favorável a esse tipo de votação, pois na eleição indireta ele seria o candidato ideal, já que a realização de uma transição democrática conciliada era muito mais fácil. Além disso, a eleição de Tancredo para a presidência teria menos oposição por parte dos militares. Na eleição direta, as chances de Tancredo ficavam reduzidas, porque o candidato mais forte para o voto popular seria Ulysses Guimarães.
A Emenda Dante de Oliveira não foi aprovada, e a eleição de 1985 foi decidida pelo voto indireto. Assim, a oposição articulou sua chapa, formada com Tancredo Neves na presidência e José Sarney para vice, para derrotar os militares. A escolha de Sarney foi estratégica e fazia parte de um plano de conquistar os votos de dissidentes do PDS, o partido dos militares.
A estratégia de Tancredo foi perfeita e ele venceu com 480 votos, 300 a mais do que o seu adversário, Paulo Maluf. Isso fez de Tancredo Neves presidente do Brasil com posse marcada para o dia 15 de março de 1985. A apreensão e expectativa de todo o país por esse acontecimento eram enormes.
A ideia era fazer a cirurgia no dia 17 de março, dois dias depois da posse, mas um mal-estar causado pelas fortes dores abdominais levou Tancredo a ser internado no Hospital de Base do Distrito Federal, na noite do dia 14 de março, ou seja, horas antes da posse. Constatou-se que Tancredo tinha uma infecção avançada e ele passou por cirurgia. Esse atendimento médico que Tancredo recebeu é entendido como questionável e cheio de falhas pelos historiadores.
Definiu-se que a posse da presidência seria realizada por José Sarney, algo que foi recebido com indignação, afinal, Sarney tinha sido apoiador dos militares durante toda a Ditadura Militar. A ideia era de que Tancredo reassumisse a presidência quando se recuperasse, mas isso nunca aconteceu. Tancredo passou por sete cirurgias, ficou semanas internado, primeiro em Brasília e depois em São Paulo, e não resistiu ao seu quadro.
O falecimento de Tancredo Neves aconteceu em 21 de abril de 1985. Seu corpo foi velado em São Paulo e ele foi enterrado em Minas Gerais. A presidência seguiu nas mãos de José Sarney e todo o processo de redemocratização do Brasil foi conduzido nesse período.